Domingo, 17 de dezembro de 2017,
Eu estava grávida de 38 semanas e 6 dias. Acordei às 4h da manhã sentindo leves contrações. Elas iam e vinham há 3 dias, mas eu não sabia se eram contrações de trabalho de parto, pródromos ou braxton hicks. Baixei um aplicativo no celular que media o intervalo e o nível de intensidade da dor. O problema era que mesmo quando o intervalo era curto, o nível de intensidade da dor não passava de médio. Por isso eu estava começando a duvidar que meu TP ia começar de fato.
Mas naquele domingo as contrações começaram a vir com mais frequência e um pouco mais doloridas, por isso passei a manhã inteira monitorando. Às 11h saímos para almoçar na casa da bisa Mariana e lá eu fiquei andando de um lado para o outro para ver se o intervalo diminuía. Funcionou. Entre meio-dia e uma da tarde eu consegui cronometrar 16 contrações. Mas era só parar de andar que o intervalo voltava a aumentar. Por isso não quis alarmar o resto da família e continuei aguardando.
Por volta de 15h eu liguei para o meu obstetra e relatei tudo o que estava acontecendo nos últimos dias. Ele disse que era provável que o TP se iniciasse naquela madrugada ou dali a duas noites. Nesse meio tempo eu só precisaria observar o intervalo entre as contrações. Minha amiga Carla, que já havia trabalhado como doula, havia me aconselhado a andar o máximo que conseguisse para acelerar o seu encaixe e também o TP. Foi por isso que ao ouvir do obstetra que o TP poderia começar naquela madrugada fui para a academia do prédio e caminhei 30 minutos na esteira. Depois fiz alguns exercícios na bola de Pilates.
Depois que voltei da academia tomei um banho longo e quente e me sentei no sofá para assistir um pouco de TV com seu pai enquanto seu irmão cochilava. Apesar da dor que ia e vinha tivemos um dia muito bom. No fim da tarde a dor começou a ficar mais intensa e eu decidi tomar outro banho. Debaixo do chuveiro tive uma crise de choro porque estava muito ansiosa e bem cansada emocionalmente de monitorar o meu corpo sem ter certeza se o que estava acontecendo era de fato o início do TP. Nesse momento seu pai teve uma intuição de que você iria mesmo nascer naquela noite e ligou para a vovó Jane buscar seu irmão para dormir na casa dela.
Seu pai nunca tinha assistido "A vida é bela" e como esse é um filme que ninguém consegue parar de ver antes do fim, nós continuamos grudados na TV depois que sua avó buscou seu irmão. Mas as dores se intensificaram e eu decidi me deitar. Fui para o quarto e consegui cochilar um pouco. Quando o filme acabou seu pai se deitou ao meu lado e começamos a marcar juntos o intervalo entre as dores. Nosso obstetra havia dito que eu deveria ligar para ele quando conseguisse marcar 8 contrações em 30 minutos. Percebíamos que se eu ficasse andando pela casa elas aumentavam consideravelmente a frequência e conseguimos marcar mais de 16 em uma hora. Mas era só eu deitar que o bendito intervalo diminuía.
Não queríamos ir para a maternidade antes da hora. Por isso eu decidi tentar dormir pensando que se aquilo fosse mesmo TP as contrações iriam me acordar. Já eram 21h30 e eu estava bem cansada já que eu estava acordada desde às 4h da manhã. Eu havia sonhado por muito tempo com um parto normal, mas não queria ficar frustrada se tivesse de passar por outra cesárea. Por isso, durante a gravidez eu orava todos os dias reafirmando a soberania de Deus sobre a sua vida e sobre a via de parto, ao mesmo tempo em que pedia para Deus guardar o meu coração de amargura ou ressentimento caso as coisas não acontecessem da forma como eu sonhava. Mas naquele momento eu simplesmente pedi a Deus que me desse discernimento sobre o momento certo de ir para a maternidade e que guardasse a sua vida. Eu estava física e emocionalmente cansada de monitorar contrações e tinha receio de perder a hora e lhe colocar em perigo.
Meia hora depois senti uma contração mais forte e percebi uma grande quantidade de líquido saindo. Sabia que naquele momento a bolsa havia estourado e agradeci a Deus em voz alta por aquele sinal tão claro de que meu TP havia começado. E filha, quando a bolsa estourou eu tive certeza de que seu parto seria cirúrgico porque foi exatamente assim que o parto do seu irmão começou. Mas por um milagre do Espírito Santo eu não senti nenhuma amargura, só gratidão pelo cuidado de Deus conosco.
A grande supresa veio quando eu levantei para informar seu pai que era hora de ir para a maternidade e percebi uma dor tão grande que eu mal conseguia parar em pé. No parto do seu irmão eu não senti absolutamente nada depois que a bolsa rompeu. Desta vez as contrações ganharam uma intensidade inimaginável que me fizeram sentir muito medo. Pensei que alguma coisa estivesse errada e que você estava correndo perigo. Eu não conseguia ficar em pé e não fazia ideia de como conseguiria esperar o elevador descer os 24 andares do nosso apartamento até a garagem, tampouco como caminharia até a nossa vaga, que é a penúltima do subsolo.
Felizmente a maternidade fica muito perto da nossa casa e como era domingo à noite não tinha trânsito nenhum. Chegamos lá em menos de 5 minutos. Mas demorou uns 10 para eu ser atendida e nesse meio tempo eu gritava por ajuda. Quando o plantonista me examinou eu ouvi a frase mais desejada por mim durante todos os dias desde a minha primeira gravidez: estava com dilatação de 4 cm e você estava completamente encaixada! Mas naquele momento aquelas palavras soaram como um balde de água fria. Como era possível sentir tanta dor e só ter 4 cm?
Comecei a gritar que não aguentaria aquilo, que precisava de anestesia ou de uma cesariana urgente. O plantonista ligou para nosso obstetra informando a ele sobre o meu estado e o dr. Luiz disse que chegaria dentro de uma hora. Neste meio tempo eu fui internada. No começo eu não conseguia parar de gritar e pedir ajuda. Senti saudades do parto seguro e tranquilo do seu irmão e me indagava onde estava com a cabeça quando idealizei o tal do Parto Normal. Naquele momento essa me pareceu a ideia mais tola e imprudente de toda a minha vida.
Seu pai tentava me ajudar como podia. Primeiro sugeriu que eu entrasse no banho, o que eu concordei em fazer depois de muita resistência. Mas a água me irritou ainda mais. Depois me sentei no sofá ao lado do seu pai enquanto ele tentava me animar dizendo que tudo estava indo muito bem e que você provavelmente iria nascer no dia que havíamos sonhado (18/12). Conversar também me irritava e eu queria ficar em silêncio. Ao perceber isso seu pai parou de falar. Mas depois me contou que orou por mim naquele momento e pediu que o Espírito Santo me fortalecesse. No mesmo instante ele disse que meu rosto, até então pálido, ficou corado e ele teve certeza de que não estávamos sozinhos naquele quarto :)
Não conseguiria descrever em detalhes o que se passou na próxima hora. Aliás, olhando para trás me parece que foram minutos. A cada contração eu tinha certeza de que não aguentaria sentir aquilo mais nenhuma vez. Nos intervalos eu chegava a cochilar de alívio e cansaço.
00h05 - entra o dr. Luiz e a enfermeira comenta que eu havia pedido para fazer cesariana.
- Erica? Pedindo cesariana? Ainda bem que eu não estava aqui para ouvir isso!
- Mas eu não estou mais aguentando essa dor...
- Deixa eu te examinar pra ver o que podemos fazer pra te ajudar. Se já tiver chegado nos 5cm eu posso ligar para o anestesista porque até ele chegar é provável que esteja com 6cm. Se ainda estiver com 4cm a gente reavalia.
As contrações estavam vindo há intervalos tão curtos que o exame de toque teve de esperar. Nesse meio tempo ele me orientou a levantar, relaxar a musculatura dos braços e pernas e a respirar. Todas essas técnicas de parto eu havia praticado durante a gravidez do Pedro, desta vez eu não quis saber de nada para não aumentar o desejo pelo parto normal.
Quando conseguiu fazer o toque o Dr. Luiz deu um sorriso dos mais satisfeitos e falou:
- Tenho uma "péssima" notícia para vocês. Não vai dar tempo de pedir anestesia. A dilatação já está em 7 cm. Ela vai nascer na próxima meia hora!
- Mas eu estou com medo!
- Erica, não precisa ficar com medo. Se você aguentou até aqui, vai conseguir ir até o fim. Você conseguiu o seu parto normal!
Embora meu corpo pedisse por um alívio daquela dor, aquelas palavras pronunciadas com tanto entusiasmo tiveram o efeito mágico de trazer à minha memória o quanto eu sonhara e pedira a Deus por um parto normal. Parei de reclamar e de pedir uma cesariana. Até porque eu nem tinha mais forças para isso. Meu corpo entrou no ritmo do parto e começou a trabalhar sozinho. Foi como se a mente tivesse ficado em modo de economia de energia para que o corpo trabalhasse na potência máxima.
Engraçado que não me senti "empoderada" em nenhum momento do trabalho de parto. Me senti frágil, completamente entregue a um sentimento muito grande de impotência e medo, muito medo. Tinha medo que meu útero se rompesse, tinha medo de não conseguir empurrar você, tinha medo que você entrasse em sofrimento, tinha medo que meu períneo sofresse uma laceração de terceiro grau, tinha medos inimagináveis e impronunciáveis.
Nos poucos minutos em que todos esses possíveis horrores me atormentavam eu tive mais duas ou três contrações. Dr. Luiz fez um novo toque e constatou que a dilatação havia chegado nos 10 cm. Dr. Luiz me informou que o risco de rotura uterina agora era zero e pediu que a enfermeira ligasse para a pediatra e informasse que você nasceria nos próximos minutos.
- Erica, agora é hora de fazer força!
As contrações continuaram a vir muito rapidamente e eu mal parava de fazer uma força, já sentia uma necessidade enorme de empurrar novamente. Este foi o momento mais crítico porque eu sentia que nunca teria força suficiente para empurrar você. Mas cada vez que eu empurrava recebia muito encorajamento por parte do seu pai e do dr. Luiz. E foi então que depois de fazer isso umas 5 ou 6 vezes eu ouvi dr. Luiz dizendo:
- Vai nascer agora!
Olhei para o seu pai esperando que ele me confirmasse isso e ele falou:
- Nasceu!
Na verdade você tinha só coroado, mas seu pai viu o topo da sua cabeça. A alegria dele ao dizer isso foi contagiante e foi como um energizante que me impulsionou a fazer a última força. Depois de empurrar mais uma vez eu senti seu corpinho sair.
Plena. Realizada. Aliviada. Feliz.
Seu pai e eu ficamos flutuando naquele sentimento maravilhoso pelos dias que se seguiram....A empolgação de narrar o parto era tão grande que contávamos em detalhes para todos os que se dispusessem a ouvir. E revivíamos aquela emoção a cada relato.
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