Sábado, 28 de março de 2015.
Eu estava grávida de 37 semanas e 3 dias. A ansiedade para dar à luz tinha
atingido o ápice, já que, além dos desconfortos físicos inerentes ao final da
gestação eu mal podia esperar o momento em que lhe pegaria no colo pela
primeira vez! Mas como a data provável
de parto estava ainda há três semanas de distância, seu pai e eu saímos para
almoçar na casa dos seus avós maternos sem a menor suspeita de que aquela seria
a penúltima vez em que sairíamos de casa sem um bebê nos braços.
Tão logo almoçamos e eu, que sentia
uma irritação extrema por estar fora de casa e muita ansiedade em relação à
forma do parto, chamei seu pai para voltarmos para casa. Mas ao me levantar da
mesa do almoço e me sentar em uma das poltronas da sua avó – que mais tarde
serviria de poltrona de amamentação em várias ocasiões – eu tive uma sensação
completamente inusitada abaixo do útero e precisei ir ao banheiro checar do que
se tratava. Naquele instante constatamos que a bolsa tinha estourado.
Seu pai e eu voltamos para
casa meio atordoados com a possibilidade de conhecermos você ainda naquele dia.
Embora a espera já aparentasse ser longa demais, não estávamos preparados para
o que viria a seguir. E naqueles instantes em que nos demos conta de que a
gravidez tinha finalmente chegado ao fim, entramos em um mundo paralelo de
excitação, apreensão, ansiedade e expectativa.
3 dias depois saíamos da
maternidade com um pacotinho no colo. E eu, que havia sido abandonada por
qualquer vestígio de vontade própria, segurança e autocontrole a partir do
momento em que me deitei na maca para me submeter a uma cesariana não desejada
e muito receada, não sabia de onde tiraria aptidões físicas, mentais ou
emocionais para operar a tarefa que de mim era esperada: cuidar de você.
Embora tenha batido o pé
durante toda a gestação de que não nos mudaríamos para a casa dos seus avós nos
primeiros dias de pós parto, naquele primeiro instante em que você estava
inteiramente sob a nossa responsabilidade, eu não conseguia conceber a ideia de
trazer você para a nossa casa. Minhas defesas caíram por terra filho, e eu me
sentia tão frágil e vulnerável como aquele bebê que precisava de mim.
Os primeiros dias de pós-parto
foram muito doídos. A dor cirúrgica era intensa, o desconforto que sentia ao me
olhar no espelho e ver aquele corpo flácido e tão maior do que o habitual –
embora não abrigasse mais nenhum bebê dentro de si –, o leite que não parava de
jorrar e deixava todas as roupas molhadas, o sangramento intenso que se segue
ao parto... Esses desconfortos físicos somados ao cansaço decorrente das noites
em claro faziam com que eu me sentisse ainda mais debilitada e assustada. Eu sentia medo de tudo o tempo todo: medo de
te machucar, medo de te mimar, medo da sucumbir à exaustão, medo de nunca mais
sentir alegria...
Vivemos muitos momentos
gostosos nos seus primeiros dias de vida, mas todos eles foram marcados pelo
cansaço e pela ansiedade. Te dava colo e peito sempre que você requisitava, o
que me deixava literalmente exausta e sem tempo até para lavar a cabeça. Todos
os planos de criar rotinas em seus primeiros meses foram por água abaixo me
deixando com a sensação de que você nos dominara completamente e de que talvez não
estivéssemos prontos para sermos pais.
O aprendizado que se seguiu a
partir destes desafios foi enorme, e hoje eu enxergo a maternidade com um pouco
mais de leveza do que enxergava dois anos atrás. Nossa família está longe da
perfeição. Como casal, seu pai e eu temos muito o que aprender. Como pais, nem
se fala.
Mas hoje enxergo a vida de
forma menos romantizada. Agora sei que é preciso esperar que as coisas sejam
difíceis, e receber tudo o que se dá de forma tranquila como refrigério de Deus. As agruras da maternidade são muitas
e aprender a ser mãe é extremamente doloroso. As renúncias são enormes, o
cansaço físico, que é grande ao fim de cada dia, não se compara ao cansaço
emocional decorrente desta responsabilidade. As crises relativas aos papéis que
desempenho como mãe, esposa, profissional, dona de casa e mulher, são
constantes e vira e mexe bate aquele desespero e medo de não conseguir dar
conta de tudo o que me propus a fazer.
A parte boa disso é abaixar
as expectativas, enxergar as pessoas com mais realismo, inclusive a mim. E
a partir daí fica mais fácil se abrir para a Graça de Deus e dar lugar à
gratidão.
E nesta carta que lhe escrevo
para registrar seu aniversário de 2 anos, eu expresso minha gratidão à Deus
pela sua vida e pelas maravilhas que Ele opera nas nossas vidas através da sua
existência. E, apesar de saber que eu tive um papel bem limitado no seu
desenvolvimento físico e intelectual, me encho de orgulho a cada vez que você
pronuncia uma palavra nova, leva a colher à boca sem ajuda ou segura sozinho
seu copo d’água.
2 anos é um tempo
relativamente curto para nós, adultos. Mal dá para concluir um mestrado, se
preparar bem para um concurso, chegar à metade de um curso de graduação... Mas
pra você, filho, representa toda a extensão da sua vida.
E como foram grandes as suas
conquistas nestes dois anos! De um bebê inerte, que mal segurava a própria
cabeça, você se transformou neste menino dinâmico que corre, pula, sobe em tudo
o que consegue alcançar, conta até 5, reconhece algumas cores, cantarola
sozinho trechos de canções e até elabora e articula verbalmente sentimentos
como: medo, angústia, felicidade e empolgação. Nem vou tentar reproduzir aqui
seu vocabulário porque ele está “enoooorme”.
Destaco apenas algumas das
suas palavras e frases mais faladas: “bigadu”, “enoooorme”, “tenho medo” ,
“ajuda, mamãe/ ajuda, papai”, a inusitada “ajuda, igreja”, "brinca, papai", "tchau, mamãe, té manhã", "brilha, Jesus", “tá quente”, “tá gelado”, “tá pertado”, “vem,
mamãe”, “veeem vovó”, “papai tá trabalhando”, “qué sisti urso polar”, “qué
não”, “que legal, divertido!”, "segura, peão" e a clássica: “dá licença, mamãe” (quando quer privacidade para fazer cocô, quando tenta fazer alguma coisa proibida ou brincar sozinho com seu pai e eu tento
entrar no meio). Sua avó costuma dizer: "Vovó te ama, promete que não esquece?". Ao que você responde: "trumpete".
Mas a frase campeã do momento
é: “Que isso?”.
Tudo desperta a sua
curiosidade e quando lhe respondemos uma palavra fácil de repetir, você repete
com muita satisfação. Sexta seu pai te levou à feira como ele faz todas as
semanas. Mas desta vez você passou todo o tempo perguntando “o que é isso?” ao
se deparar com pessoas, barracas, legumes, frutas, árvores e lugares. E a cada
vez que ele lhe respondia: maçã, laranja, estacionamento, barraca, etc, você
repetia com grande entusiasmo.
Você é apaixonado por bichos
e conhece vários deles pelo nome: cachorro, gato, girafa, elefante, lobo, urso
polar, hipopótamo, gatinho, leão, tigre, dinossauro, porquinho, peixe, tubarão, tucano, arara,
gavião, sapinho, patinho, golfinho (mais conhecido como tufinho) e cavalos, que
são os seus favoritos!
A nova moda é se referir à
você na terceira pessoa. Às vezes você fala: “o Pedrinho fez isso” ou “isso é
do Pedrinho.” E desde que sua bisavó falou que você ainda é bebê você começou a
se referir à você mesmo como “o bebê”. Se começa a tossir diz: “O bebê ta
tossindo”. Se faz uma bagunça na sala e alguém lhe pergunta quem fez isso você
responde: “o bebê”.
Você tem uma personalidade
forte e eu diria que até um pouco obstinada. Os acessos de raiva e birras já se
tornaram constantes no nosso dia à dia. Muitas vezes é preciso falar bem duro
com você, mas em outras, basta um abraço carinhoso pra que você se acalme e
recobre o bom humor que é sua marca registrada J
Seu sorriso gostoso nos
acompanha desde às seis da manhã, quando você levanta da sua cama e vai até a
nossa acordar o seu pai para brincar. E na hora em que te colocamos pra dormir, é com sorrisos e chamegos gostosos que você finalmente adormece.
Você presenteia seus amados com
muitos abraços, sorrisos e beijos. E a forma que tem encontrado para demonstrar
predileção por alguém nestes dias é chamando a pessoa para se sentar ao seu
lado no chão e brincar, ao mesmo tempo em que pede pra que eu te deixe a sós
com a pessoa dizendo: “dá licença, mamãe!”. O medo de outras crianças ainda não
cedeu completamente, mas quando você se encanta por alguma, é difícil se
despedir.
Seus avós – maternos e paternos
– ocupam um espaço “enoooorme” no seu coração. E seus bisavós também são motivo
de muita alegria na sua vida. Comemoramos seu aniversário no sábado na casa da
bisa e foi muito gratificante perceber o quanto este foi um dia alegre pra
você. O empenho que seus bisavós e tio-avô Roberto tiveram para deixar a casa
decorada para sua festinha foi comovente. Eles abriram seus corações e vidas
completamente pra você, filho. E graças a Deus você vem retribuindo tamanho
afeto com muito amor e carinho.
Minha oração de hoje é pra que você sempre
coloque as pessoas em primeiro lugar. Que seu coração seja quebrantado e que
desde pequeno você seja cheio do Espírito Santo. Que você se veja como meio, e
não fim na vida das pessoas. E que, por meio da sua vida, muitas outras sejam
abençoadas e edificadas. Que você seja generoso, amoroso, solidário e
carinhoso. Que não tenha medo de demonstrar afeto e que também não tenha medo
de demonstrar tristeza. Que o amor seja a base da sua identidade pra que você
nunca sinta que tem que fazer ou conquistar algo para ser amado. Que você seja
livre para se desenvolver plenamente, mas que conheça desde cedo o caminho do
bem e se abstenha do caminho do mal. E que você caminhe com fé, amor e esperança pela jornada desta
vida que acabou de começar, mas que já trouxe tanta alegria para nós que temos
o privilégio de caminhar ao seu lado.
Te amo.